Facções na mira: pressão dos EUA acirra debate sobre segurança pública no Brasil

Compartilhe:

A segurança pública brasileira entrou no centro de uma disputa geopolítica e legislativa recente. Segundo a Reuters, em reunião no Itamaraty, no início de maio, o Departamento de Estado dos Estados Unidos, chefiado por David Gamble, pediu que o Brasil classifique o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) como grupos terroristas. Segundo o Departamento de Estado, as facções já operam em ao menos 12 Estados norte-americanos, o que justificaria o uso da Lei Antiterrorismo brasileira (13.260/2016) para permitir sanções financeiras, bloqueio de ativos e cooperação direta com o FBI e a DEA.

O governo brasileiro, no entanto, resiste à proposta. Para o Ministério da Justiça, facções como PCC e CV têm motivações puramente financeiras, sem viés político, religioso ou ideológico — critérios exigidos pela legislação atual. O Itamaraty também teme que a mudança crie precedentes de ingerência externa em assuntos de segurança nacional.

Apesar da hesitação do Executivo, o Congresso avança. A Câmara dos Deputados aprovou em maio regime de urgência para o PL 1283/2025, de autoria do deputado Danilo Forte (União-CE), que propõe ampliar a definição de terrorismo a grupos que usam violência para controlar territórios e gerar pânico social.

Parlamentares de oposição, como Nikolas Ferreira (PL-MG), defendem que a mudança permitirá maior integração com agências internacionais e acesso a tecnologias avançadas de rastreamento, protocolos de contraterrorismo e bases de dados globais. Já a base governista teme impactos sobre movimentos sociais e direitos constitucionais.

O rastro de violência

Levantamentos recentes reforçam a urgência do debate. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública revelou que o Comando Vermelho já domina 130 municípios na Amazônia Legal, enquanto o PCC atua em 28. Essa expansão territorial está ligada ao aumento da violência, garimpo ilegal e enfraquecimento do poder do Estado. Estados onde as facções disputam território registraram aumento de até 46% nos homicídios.

Soberania em questão — ou oportunidade?

Para o Itamaraty, rotular as facções como grupos terroristas pode criar precedente de ingerência externa em segurança pública. Defensores da mudança, contudo, enxergam três ganhos imediatos:

  • Tecnologia de rastreamento: ferramentas avançadas para seguir fluxos financeiros e de armamentos em tempo real;
  • Treinamento especializado: cursos do FBI e protocolos de contraterrorismo desenvolvidos após o 11 de Setembro;
  • Bases de dados internacionais: acesso a informações sobre rotas e financiadores do crime, hoje restritas a acordos focados em narcóticos.
Próximos passos
  • Câmara: o mérito do PL 1283 deve ser votado nas próximas semanas;
  • Senado: caso passe, o texto pode receber ajustes para resguardar direitos fundamentais;
  • Palácio do Planalto: o presidente Lula sinaliza possível veto a pontos considerados excessivos;
  • Governadores: Estados cobram instrumentos que facilitem o bloqueio de bens e o intercâmbio de inteligência.

Esses especialistas lembram que a cooperação continuaria sob comando brasileiro, reforçando — não reduzindo — a soberania nacional.

A decisão sobre rotular ou não as facções como terroristas expõe um dilema central: preservar a soberania nacional ou intensificar a luta contra o crime com apoio externo. O Congresso tem agora a responsabilidade de encontrar um equilíbrio entre eficácia e garantias democráticas — e decidir se o Brasil dará um passo simbólico ou estratégico na guerra contra o crime organizado.

Compartilhe:

Leia Também

toggle icon
plugins premium WordPress